Estou em crer que também as palavras caducam. É um problema que tem a ver com o seu significado. Ironicamente. Porque é um relevo que a chuva do tempo lava e destrói num ápice. Acho que tenho o meu dicionário repleto de palavras caducas, decadentes e já vazias de significado. Algumas porque nunca o tiveram, embora eu achasse que sim. Porque ele existia. E ele está lá, escrito à sua frente. Mas eu não o vejo, não o leio, não o entendo. Nada é para mim. Preenche-me da mais absoluta insignificância, e é uma ignorância que me agrada, porque não quero saber quando as palavras doem. Quando as palavras modificam. Se modificam. Quando a incontinência verbal dá azo a flexões que me vergam, a síncopes em que desmaio , a aféreses que teimo em subtrair à inconsciência do meu próprio discurso, e se vislumbram as regras injustas da mudança que me deixa desregrado. Quanta teimosia há nas palavras que rebatem na escuridão dum muro alto que nunca vimos ser feito à nossa frente. É uma construção mecânica, que só nos apercebemos quando já a luta se prolonga sozinha, porque nós nunca a abandonamos. Ou ela a nós. É um raio de luz que se extingue subitamente, porque se pensou no que nós não pensamos. Porque tudo era cosmos, e nós jamais fomos estrelas. Porque só o disseram que fariam porque tu querias. Porque nada corta mais do que te estarem apenas a fazer a vontade. Nada nunca foi tão claro como o absoluto obsoleto ser que agora sentes que és. E tudo o que resta, é aquele dicionário, que nunca jamais em tempo algum conseguirá dizer tudo aquilo que alguma vez significaste, quando julgavas tu estar a ser alguém.
Para alguém. Para ninguém.
Para alguém. Para ninguém.