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domingo, 4 de novembro de 2007

Crisálida Pálida

E eis que tudo faz sentido. Senti o cheiro da primeira chuva ao molhar a terra virgem dos teus passos, e percebi que há beleza em tudo que seja breve. Um segundo basta para a luz varrer a escuridão. Eu sei porque vi em mim algo maior do que eu, algo que seduz a sedução de sermos sedutores e tenta a tentação de sermos tentadores. Eu sei porque aprendi que é no fim que vamos querer estar e dizer presente. Para vermos o epílogo das vidas que marcamos. Para ver em que mar foi desaguar o leito em que nos deitamos ontem, ou há muitos anos. Nunca amanhã, porque isso fica para quem vier depois. Sejamos eternos então. As águas são saudáveis, e a dívida de colo que teremos de pagar será sempre o nosso motivo mais querido. Porque as altas árvores nunca conseguirão tapar a imensidão dos céus, e porque sei que, de vez em quando, dum qualquer lugar espreitas a ver se me vês a ser cada vez mais eu e cada vez menos outra coisa qualquer. E quando se sabe que se fez tudo que se podia fazer, dorme-se tranquilo. Com o cheiro a terra molhada entranhado em cada sonho que vamos ter enquanto dormimos, pesadamente, como uma criança satisfeita.

7 comentários:

Anónimo disse...

Quando cai a primeira chuva, gosto de abrir a janela e respirar a plenos pulmões... Dos cheiros que a natureza pode oferecer, é o que mais gosto. Sente-se um renascer em cada particula do ar. É efémero, de facto. Mas, se não fosse não tinha tanta grandeza aos nossos olhos... Porque só as coisas únicas nos tiram o sono ou nos inquietam.
Os momentos bons são crisálidas pálidas com prazo de um dia.
Eu também quero estar no fim do curso do meu rio para ver onde fui desaguar, mas quem não o quer?

Cuida-te
um abraço do tamanho do mundo

(obrigado por teres postado)

Anónimo disse...

Bom saber que esse sentido (que nunca deixou de existir) regressou... há beleza em tudo o que seja teu e é a partir da consciência disso que ela nunca deixará de estar presente;)
Melhor ainda perceber que já começas a ver em ti tudo aquilo que nós (outros) vemos e admiramos!

É hoje que te queremos presente e ficamos assim na tua companhia como crianças satisfeitas!!

Particularmente: “Nunca amanhã, porque isso fica para quem vier depois. Sejamos eternos então.(...) e a dívida de colo que teremos de pagar será sempre o nosso motivo mais querido.” – aquele suspiro...!!

Anónimo disse...

Numa palavra: Lindo!
Escreves realmente muito bem e, nas tuas palavras, muitas vezes leio a minha alma.

bj

Anónimo disse...

És deprimente

Vaskio disse...

Ainda bem que sou!

* misty * disse...

O cheiro a terra molhada recorda-me sempre o meu regresso a casa. ou à sintonia das coisas gerais. Quando esse cheiro assalta pequenos cubículos entre os cimentos urbanos de onde moro agora, sinto que existe um ciclo gigantesco do cosmos e dos sonhos, que nos afecta a todos os sentidos e que nos sossega nos passos que damos em frente.

De onde eu venho acordo de manhã e abro as janelas de par em par, com vista privilegiada para a montanha e com cheiro verdadeiro de Outono. O cheiro a terra molhada e a chocolate quente ao fim da tarde. Mas onde eu moro agora também cheira assim de vez em quando, entre brechas dos dias e das paredes e das ruas movimentadas de horários e prazos. Não é má de todo, essa brevidade, talvez se dela não fossem feitos esses momentos ou esquissos, não os sentiríamos da forma certa, com aquele formigueiro na alma que inquieta e seduz.

E, bem digamos que os cheiros/momentos breves são como as pessoas... a sua brevidade por vezes vira eterna... "Sejamos eternos então", para o que importa, para quem importa...

(ps: ao lado do post, a melhor versão de sempre, é mesmo, não arrepiou só da primeira vez!! :D)

patricia disse...

Crisálida, bolsa de abrigo
saco de transporte
mala de viagem
com pouca bagagem

Pálida, a luz que a varre
não queima
não torra
apenas ilumina

e as veias
e a seiva
estão lá dentro
a dormir pesadamente
enquanto esperam
que o cheiro a terra molhada
lhes desperte o sentido
e lhes dê o beijo da vida

para terem asas
felizes para sempre